Até agora pouco estudado e comentado pela historiografia, o episódio vem ganhando contornos mais definidos sob a luz de documentos originais, boa parte deles inéditos. O material, manuscrito, inclui cartas, despachos de conselheiros do regente português, crônicas e até rascunhos encontrados em Portugal pela historiadora Silvia Hunold Lara, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em pesquisa realizada no âmbito do Projeto Temático “Trabalhadores no Brasil: identidades, direitos e política (séculos XVII a XX)”.
A documentação tem permitido que Lara e outros historiadores tracem uma nova cronologia sobre Palmares. “Em geral, a historiografia periodizou a história palmarina a partir das guerras feitas contra eles. Procuro me concentrar na formação dos mocambos [os assentamentos de fugitivos] e entender como eles se organizavam em termos políticos e militares”, disse Lara à Agência FAPESP.
“A década de 1670 é importante porque marca o reconhecimento por parte das autoridades portuguesas e coloniais desse sobado (estado africano)
Em seus estudos, Lara retoma teses de uma vertente da historiografia que dá ênfase às raízes africanas de Palmares, na qual se incluem os brasileiros Nina Rodrigues (1862-1906) e Edison Carneiro (1912-1972) e os norte-americanos Raymond Kent (1929-2008), Stuart B. Schwartz e John Thornton.
De acordo com Lara, um documento-chave para entender Palmares é uma crônica anônima, com data atribuída a 1678, escrita logo depois do acordo de paz selado entre Ganazumba e o governo de Pernambuco, quando d. Pedro de Almeida volta a Portugal e vai mostrar seus feitos às autoridades portuguesas.
Essa crônica sempre havia sido lida pelos estudiosos a partir de uma publicação na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro de 1859 – feita quase 200 anos após ser redigida. “Ela dá nome aos mocambos, descreve as relações entre os chefes militares e os chefes dos mocambos, conta as expedições feitas e equipara a uma conquista militar a vitória [parcial] obtida em 1677 por uma expedição que destrói os mocambos e está na origem do acordo de paz.”
“As pessoas não viram o original, que estava perdido nos arquivos. Quando você olha o original, pode ver que houve transcrições incorretas. A maior parte de quem lidou com Palmares trabalhou com uma documentação impressa. E quem transcreveu e publicou fez uma seleção. Ao ir às fontes e aos arquivos, localizei uma quantidade muito grande de fontes ao redor desses documentos transcritos, muitas nunca publicadas”, disse.
Os achados estavam no Arquivo Histórico Ultramarino e no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa, e na biblioteca pública da cidade de Évora, interior de Portugal. Diversos bolsistas também produziram trabalhos relacionados à produção da base de dados.
Fonte: http://agencia.fapesp.br/17644
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